10 de jan. de 2009

derrubando mitos


Neste último mês pude realizar algumas Santas Ceias no meu distrito pastoral e me deparei, mais uma vez, com um mito que persiste não somente nas Congregações das quais cuido, mas aparentemente no meio evangélico em geral. Argumenta-se que quando não estou bem com o meu próximo não devo participar desta principal festa cristã ("... Santa Ceia não é para conversão de pecadores e sim para edificação de discípulos" segundo Spurgeon, cujas idéias eu utilizo como fonte de motivação e inspiração para este post).

Tenho tentado me dedicar à erradicação deste falso mito, mas percebo cada vez mais quantas coisas nós fazemos no piloto automático (e realmente me incluo neste 'nós') sem de fato compreender o que estamos fazendo ou o que está por trás de cada ato. Convenhamos, é tão mais fácil viver a vida de forma aparentemente livre, leve e solta em vez de refletir em cada ato e atitude. É, de fato, muito cansativo...

Foi há relativamente pouco tempo que eu me dei conta de que a visão tradicional a respeito do pré-requisito para participar da Santa Ceia estava profundamente equivocada. O texto diz pura e simplesmente “Examine-se, pois, o homem a sim mesmo, e assim coma do pão e beba do cálice.” I Co 11:28 (ênfase minha)

Segundo o texto o único pré-requisito é o auto-exame, a auto-avaliação... o olhar no espelho. E o mais interessante é que não é um pré-requisito eliminatório. O texto não diz que depois de me examinar eu possa decidir se eu devo participar ou não. Esta opção não foi dada! Paulo fala que “e assim” eu devo prosseguir e participar do pão e do cálice, dos símbolos que representam a minha aceitação da morte de Cristo em meu lugar.

Fiz questão de dar uma olhadela na palavra original em grego (οὕτω - houtō) e não tem escapatória: tanto a auto-avaliação como a participação na Ceia do Senhor são obrigatórias. Participar indignamente é participar sem se examinar, sem se preparar, sem olhar a fundo para si mesmo e compreender onde eu estou espiritualmente e o quanto eu ainda preciso crescer.

Ai daquele ou daquela que depois dessa avaliação chegar à conclusão de que pode participar dignamente desta festa espiritual. É exatamente este resultado que mostraria quão profundamente equivocado eu estaria e demonstra que não há verdadeira compreensão do que significa a morte Dele em nosso lugar... afinal, nunca seremos merecedores e dignos por conta própria para receber este presente. É a Misericórdia de Deus que nos dá a chance da Salvação de graça, realidade que é celebrada na ceia do Senhor.

O resultado do “examine-se” deve ser 1) a compreensão profunda de que não sou digno e 2) uma análise realista a respeito da minha caminhada com Deus conduzida pelo Espírito Santo. Conseqüentemente eu irei, com ajuda Dele, ver onde preciso crescer, quanto mais tempo precisarei passar com Ele e quanto mais eu devo amar o meu próximo, pois Ele me dá poder para isso. Compreendendo o meu estado de indignidade pessoal e com metas espirituais específicas eu participo não sozinho, mas com semelhantes nessa caminhada que são igualmente indignos. Ao participar da Ceia com esta consciência eu passo a discernir o corpo de Cristo (I Co 11:29) que é o seu povo, o meu irmão e irmã, aqui na Terra. Como indignos participamos juntos da Graça e Misericórdia de Deus para conosco, conscientes de que somos um Nele.

O resultado de uma Santa Ceia de forma consciente é infalível. Conscientiza, une, restaura relacionamentos (com Ele e com o próximo) e objetivos, fazendo com que todos se sintam um.

Nunca, repito NUNCA eu devo deixar de participar de uma oportunidade dessas. A maldição que recai sobre o participar indignamente é a mesma para quem não participa: é a maldição da não-salvação... da perdição.

De repente em outro post descrevo algumas sugestões bíblicas de como fazer esta auto-avaliação, mas por enquanto é só.

Forte abraço

Shalom


imagem: estudo para "Santa Ceia" de Leonardo da Vinci

13 comentários:

Anônimo disse...

e como eu sei se estou digno a participar de uma ceia?

André R. S. Gonçalves disse...

ninguém é digno... tentei deixar isso claro... a partir do momento em que eu me examinei e tenho consciência da minha indignidade (não somente da boca para fora, mas de forma específica) eu estou apto para reconhecer um pouco da grandeza da morte de Cristo por mim e, assim, participar da Ceia Dele...
no entanto, faço questão de de repetir a idéia de Spurgeon que coloquei no início do post: a Santa Ceia é para a edificação de disícpulos, é para quem já aceitou Cristo e não para quem ainda quer ou vai aceitá-lo...
forte abraço

Mani Maria disse...

ótima reflexão para publicar nos boletins das igrejas, principalmente época da páscoa e semana santa!

Paula Roboredo disse...

Muito bom o seu post, Pastor.
É comum o pensamento da indignidade como sendo uma barreira para se achegar a Deus, mas é exatamente ao contrário, a nossa indignidade deixa Deus, ser Deus.

Anônimo disse...

Pr. André:
assino embaixo do seu (feliz) arrazoado, aditando uma sugestãozinha esclarecedora da verdadeira intenção do autor- Paulo - basta ler todo o capítulo pra entender o que ele quis dizer com participar "indignamente": naqueles idos, muitos dos primeiros cristãos iam pra Ceia pra "se embriagarem" e pra glutonaria... simples assim...

Francisco Gonçalves
IASD Barra da Tijuca-RJ

Anônimo disse...

Pr. André:
assino embaixo do seu (feliz) arrazoado, aditando uma sugestãozinha esclarecedora da verdadeira intenção do autor- Paulo - basta ler todo o capítulo pra entender o que ele quis dizer com participar "indignamente": naqueles idos, muitos dos primeiros cristãos iam pra Ceia pra "se embriagarem" e pra glutonaria... simples assim...

Francisco Gonçalves
IASD Barra da Tijuca-RJ

Anônimo disse...

rev. André..
todo o texto, sem nenhum pretexto deveria fazer parte do contexto cristão!
ps.: D-us seja louvado em também por isto!
shalom

Anônimo disse...

Olá Pr. André,
Achei enriquecedor este artigo que você postou sobre a Santa Ceia. Era um assunto que muitas vezes eu já havia me questionado.
Gostei muito do seu blog e pretendo ler com regularidade os seus artigos.
Gostaria que você pudesse depois fazer uma explicação mais aprofundada do texto de Spurgeon: "a Santa Ceia é para a edificação de disícpulos, é para quem já aceitou Cristo e não para quem ainda quer ou vai aceitá-lo..." - Eu gostaria de entender melhor esta declaração de acordo com o que está nas Escrituras.
Um forte abraço do seu chará!

Nika disse...

Gostei muito do seu post...
Faz sim sentido, afinal não há ninguém puro e sem pecados nesse mundão de MEU DEUS...
Mas então de onde saiu essa "lenda" de que somente pessoas consiliadas com seus irmãos poderiam participar?
Pode fazer um paralelo?
Obrigada!
=**

André R. S. Gonçalves disse...

estou terminando uma mudança e por isso não tenho tido acesso à net para responder... estou escrevendo de uma lan-house e, portanto, serei breve...
primeiramente quero agradecer pela participação de todos vcs... isso motiva mais ainda a escrever e compartilhar tanto com o feedback positivo como o crítico (construtivo de preferência ;))
Paizinho (Francisco): concordo com a sua colocação... é isso mesmo, o contexto é do excessos que aconteciam tornando as Santas Ceias mais semelhantes com os cultos à Baco, deus pagão de muitas regiões daquelas cartas... vejo, no entanto, que textualmente o 'indignamente' se refere mais especificamente ao não se preparar com a auto-avaliação para a Santa Ceia do que para essa questão do contexto maior... pelo menos essa é a minha leitura
André: na verdade fiz uma alusão à um sermão de Spurgeon onde ele argumenta que só devem participar da Santa Ceia quem já e seguidor/discípulo de Cristo em função da algumas questões práticas dentro do contexto de ceia e festividade: vc tem que ter vida e apetite para se alimentar. além disso precisa conhecer o anfitrião pessoalmente e, acima de tudo, precisa ter condições de discernir o Corpo de Cristo (o Seu povo) para participar dignamente como diz o próprio texto... é um ato coletivo e não individual e, portanto, não é para não tenho esses pré-requisitos... não uso o termo batizado ou não-batizado de propósito, apesar de crer que o batismo seja a exteriorização de uma decisão pessoal... o que eu pessoalmente entendo do texto e infiro é que se vc não está pronto para tomar uma decisão pública quanto a Cristo (batismo) vc não está pronto para a Santa Ceia ainda (espero ter esclarecido alguma coisa)
Nika: esse 'mito' veio da junção descabida de textos bíblicos que não têm nada a ver com Santa Ceia (por exemplo o texto referente a ofertas e relacionamento com irmão) com uma pré-concepção generalizada e nada textual do significado da palavra 'indignamente'. Acredite, tem muito disso aí em muitos outros atos religiosos!
forte abraço a todos
shalom

Anônimo disse...

Oi André!
De fato é muito mais fácil utilizar critérios objetivos e generalizados, mas eles são bem perigosos. Sobre a indignidade, por exemplo, eu já vi diaconisas escohendo quem devia ou não participar da Ceia pela roupa que estava usando. Uma conscientização de nossa indignidade deveria fazer parte do ritual de cada Santa Ceia para ver se a idéia de justificação vai entrando enfim nas nossas mentes. Abraço!

Anônimo disse...

Amigo, ótimo. Esclarecedor. Vou repassar. Abraço. Pri Có.

André R. S. Gonçalves disse...

Pricó e Lux...
prazer em ter vcs por aqui nesse espaço
shalom